Mais um ônibus
estaciona ao lado da calçada colorida, construída com placas de cimento
moldadas e ajustadas artesanalmente, com frases, assinaturas e marcas de pés e
mãos. É a “Calçada da Fama” do Ateliê Izu. Dezenas de turistas passam
diariamente sob um portal esculpido com garças e tuiuiús e, disparando suas
máquinas fotográficas, entram em um espaço surreal, com esculturas espalhadas e
muros recobertos por desenhos em alto-relevo, como gigantescas páginas
impressas que contam histórias. Histórias e mais histórias... Das nações
indígenas, do Pantanal, de Corumbá, da Guerra do Paraguai.
Se os turistas derem
sorte, poderão encontrá-la retocando um muro ou trabalhando em uma estátua. Uma
senhora octogenária, ágil, dona daqueles olhares que acompanham até pensamento:
Izulina Gomes Xavier, ou simplesmente Izu. Ela nasceu no dia 18 de abril de
1925 em Simões, uma cidadezinha do Piauí, que na época nem escola tinha,
próxima às fronteiras com Pernambuco e Ceará, quase na serra do Araripe. Ainda
menina foi alfabetizada pelo avô, juntamente com seus dez irmãos. Desde 1944,
então recém-casada, essa bela e sensível mulher reside em Corumbá, MS, onde
construiu sua família e mais, muito mais. Inclusive esculturas!
Ao entrevistá-la,
encantada com a possibilidade de escrever sobre sua personalidade inigualável,
recolhi esse depoimento:
"Eu vivi no
campo, nadei com os peixes, cantei com os pássaros e voei com as borboletas. Já
fui muito feliz. E nada me impede, com tudo o que eu passei, de eu ainda ter
minha felicidade. De vez em quando eu me descubro voando, feliz da vida. Uma
sensação tão boa, tão gostosa... Quando eu consigo terminar uma escultura que
eu gosto, eu fico numa felicidade que você não queira nem saber."
Uma das etapas mais
divertidas da entrevista (e reveladora da genialidade de Izulina) foi quando
pedi para ver algum registro de seu processo criativo — um esboço, o croqui de
alguma escultura. Qual foi meu espanto ouvi-la responder que não coloca nada no
papel, nem um traço, um rascunho, um desenho sequer. Incrédula, pedi-lhe para
me contar como criava uma escultura. E ela revelou:
"Eu fecho os
olhos e assopro. Parece que eu vejo assim formar como se fosse uma poeira, uma
cinza, uma coisa assim, uma nuvem... A escultura no ar. Aí eu não tenho dúvida.
Eu vou e faço. Executo exatamente como ficou no meu assopro. [rindo] Minha filha, você acredita nisso? [rindo] Se você não acredita, perdão. Mas é o que
acontece comigo."
E hoje tenho um
pequeno livro de quarenta páginas, recém-publicado pelo Instituto Histórico e
Geográfico de Mato Grosso do Sul, ao qual dei o único título que achei ser fiel
a essa artista: Izulina Xavier –
Esculturas no ar. Nele descrevo fragmentos da vida dessa mulher
forte e destemida que descobriu a realização de sua vida madura como escultora.
Conhecê-la foi um presente ímpar que a vida me deu. Espero que um dia você
tenha a mesma sorte que eu.
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IMAGEM: Izulina Xavier e eu, no Ateliê Izu, ao lado de uma de suas
esculturas, tendo ao fundo (à direita, no reflexo do vidro) uma vista parcial
do portal com garças e tuiuiús.
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Conheça as etapas de construção de uma das obras:
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TÍTULO DO LIVRO: Izulina Xavier — Esculturas no ar
AUTORA: Maria Eugênia Carvalho do Amaral
EDITORA: Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso do Sul
Série “Eu Sou História” — Volume XIV
NÚMERO DE PÁGINAS: 40
Instituto Histórico e Geográfico de
Mato Grosso do Sul - IHGMS
Endereço: Avenida Calógeras, 3000 (uma casa em frente à área de embarque da
antiga Estação Ferroviária de Campo Grande).
Telefone: (67) 3384-1654
E-mail: ihgms@ihgms.org.br