segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Prêmio Nobel? Não! Prêmio “Ig Nobel”

Como acontece anualmente há 21 anos, na mesma época da divulgação dos ganhadores do renomado Prêmio Nobel são revelados os nomes dos laureados por outro prêmio, não tão famoso, mas muito divertido e ansiosamente aguardado pela comunidade científica mundial: o Prêmio Ig Nobel. Um acontecimento que, segundo um comentário bem-humorado da conceituada revista científica Nature, “é reconhecidamente um dos grandes destaques anuais do calendário científico”.

O prêmio é concedido pela revista norte-americana Annals of Improbable Research (Anais da Pesquisa Improvável), que avalia com muito humor os estudos produzidos por cientistas no mundo inteiro. A irreverência do prêmio já fica evidente no logotipo da revista: a escultura “O Pensador”, de Rodin, caída de seu pedestal.

O site do prêmio — www.improbable.com — explica que “tecnicamente falando, o Ig Nobel homenageia pessoas cujas pesquisas não podem ou não devem ser reproduzidas”. O site também apresenta todos os ganhadores dos últimos anos, com links para acesso às publicações originais. A grande meta do Ig Nobel é divulgar trabalhos científicos que inicialmente fazem rir e depois levam a pensar. A premiação visa revelar o atípico e bizarro na ciência, homenagear a criatividade e, através do humor, promover o interesse pela pesquisa científica.

As premiações desse ano foram:

Ig Nobel da Paz — Neste ano, excepcionalmente, não foi concedido a um pesquisador, mas a um prefeito, por seu comportamento considerado exemplar. O vencedor foi Arturas Zuokas, prefeito de Vilnius, na Lituânia, por descobrir como utilizar um tanque de guerra em “exercícios” educativos: esmagar carros luxuosos que estacionam em locais proibidos, como faixas de pedestres ou ciclovias (veja a foto):


Ig Nobel de Medicina — Concedido a um grupo de cientistas da Holanda (Universidade Twente) por demonstrarem que as pessoas, quando estão muito apertadas para urinar, tomam decisões melhores sobre algumas coisas e piores sobre outras.

Ig Nobel de Química — Os agraciados, da Universidade de Shiga, Japão, calcularam a densidade ideal de gotículas de wasabi (raiz-forte) para ser utilizada em um borrifador que, ao ser aspergido no ar, provoca uma irritação tão forte no nariz das pessoas a ponto de acordá-las. O responsável pela pesquisa, Makoto Imai, patenteou seu borrifador de wasabi para ser utilizado como “alarme” em qualquer emergência noturna, despertando todos.

Ig Nobel de Matemática — Dividido entre sete “pesquisadores” por terem previsto (erroneamente, é claro!) datas para o “fim do mundo”. Quatro americanos calcularam que tudo acabaria em 1954, 1982, 1990 e 1994. Um deles, Harold Camping, errou a primeira data (1994) e foi persistente ao recalcular o Juízo Final para maio de 2011. Um sul-coreano, Lee Jang Rim, afirmou que o planeta deixaria de existir em 1992. O japonês Shoko Asahara disse que seria em 1997 e a ugandense, Credonia Mwerinde, previu o evento para 1999. O prêmio, segundo os organizadores do Ig Nobel, foi merecido pelos sete (cavaleiros do Apocalipse?) “por terem ensinado ao mundo como ser cuidadoso quando se fazem cálculos e suposições matemáticas”.

Ig Nobel de Biologia — Concedido a dois entomologistas das universidades James Cook (Austrália) e de Toronto (Canadá), pela descoberta de que certos besouros machos, ao copularem, faziam confusões entre as fêmeas da espécie e algumas garrafas de cerveja. A grande conclusão foi que “não se tratava de garrafas quaisquer. A cópula só acontecia com garrafas usadas, marrons e... australianas”.

Ig Nobel de Psicologia — Ao tentar entender por que as pessoas suspiram no dia a dia, o Prof. Karl Teigen, da Universidade de Oslo (Noruega), foi agraciado por demonstrar que, embora a maioria das pessoas associem o suspiro com estados emocionais negativos, de desistência ou de baixa energia, ele é na verdade um mecanismo não-intencional para criar uma pausa antes que uma atividade, plano ou desejo possam ser descartados e substituídos por uma nova iniciativa.

Ig Nobel de Física — Concedido a Philippe Perrin (Universidade Henri Poincaré), França, e seus colaboradores por mostrarem que os atletas que arremessam discos relatam sentir tonturas, diferentemente dos que arremessam martelos, apesar de ambos os movimentos envolverem rotações.

Ig Nobel de Literatura — O agraciado foi John Perry (Universidade Stanford), EUA, por sua “Teoria da Procrastinação Estruturada” que, em resumo, afirma que: “Para ter grande sucesso, sempre trabalhe em algo importante, de modo a evitar fazer algo que seja ainda mais importante”.

Premiar pesquisas que nos causam estranheza e que (ao menos aparentemente) não possuem nexo: esse é o aspecto espirituoso do Ig Nobel. E é exatamente o “esquisito” na ciência que muitas vezes nos leva a avanços incríveis. Ou você acha que, em sã consciência, alguém levaria a sério um cientista que começasse a se interessar por um mofo que crescia em placas de vidro sujas em seu laboratório? Pois foi dando atenção aos restos de cultura mofada encontrados na vidraria usada que Alexander Fleming descobriu o que hoje chamamos de penicilina – um grupo de antibióticos. (O tal mofo era o fungo Penicillium notatum e o ano era 1928.)

Não precisamos voltar tanto no tempo para identificar prováveis ganhadores do Ig Nobel. Basta a observação atenta de um dos premiados com o Nobel (o verdadeiro), em 2008: um cientista japonês, Dr. Shimomura, levou anos estudando por que um tipo de água-viva emitia luz verde sob o efeito de raios ultravioleta. Um estudo um tanto quanto descabido... Não parece um candidato ao Ig Nobel? Pois a tal luz verde, sabe-se agora, é emitida por uma proteína hoje amplamente utilizada em pesquisas bioquímicas como marcador de importantes processos biológicos que até então não podiam ser estudados por serem “invisíveis”. E o Dr. Shimomura, merecidamente, recebeu o Prêmio Nobel de Química!

Na última década, o Ig Nobel transformou-se em um evento prestigiado pelo meio científico e pela mídia mundial, com a presença de genuínos ganhadores de Prêmios Nobel, que de bom grado comparecem para entregar os troféus aos vencedores do prêmio “concorrente”, em uma cerimônia divertidíssima no Teatro Sanders da Universidade Harvard. É um momento especial da comunidade científica mundial. “Nóbeis” e “Ig Nóbeis” exercitando um dos melhores atributos da espécie humana: rir de nós mesmos!


 

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