Todos nós (com exceções, é claro) gostamos de fazer compras. Você pode até ser do tipo que não as “faz”, mas certamente delas usufrui, em maior ou menor grau. Resumindo: somos todos consumidores e, menos ou mais conscientes, estamos imersos em uma economia baseada no consumo.
Qual é o problema em fazer compras? O comércio ganha com isso. O produtor e o distribuidor também ganham, assim como, obviamente, a parte mais interessada: você, que ganha porque adquiriu alguma coisa que queria ou de que precisava. Enfim, trata-se de uma série de elos coesos, em diferentes graus de dependência. Aparentemente, essas interrelações são tão familiares que nos parecem naturais na vida em sociedade. É exatamente aí que moram o perigo e as contradições: o que compramos, por que compramos e de quem compramos.
Retratando os hábitos de compra e venda, seus custos e consequências, foi lançado nos Estados Unidos no final de 2007 um curta-metragem que transporta o espectador para uma viagem instigante pela cultura de consumo — desde a extração de recursos, passando pela produção e distribuição de um bem qualquer, até seu descarte —, expondo o custo real desse bem. E assim, o filme mostra os diferentes caminhos percorridos pelas “coisas” que são vendidas e compradas, caminhos esses que são objetos de estudo da “economia de materiais”.
O filme, “The Story of Stuff” (A História das Coisas), foi escrito pela economista Annie Leonard. Com pós-graduação em Planejamento na Universidade Cornell, em Nova York , Annie especializou-se em problemas internacionais de saúde ambiental e sustentabilidade ao longo de mais de 20 anos de pesquisas, que a levaram a percorrer fábricas e descartes de lixo ao redor do mundo.
Em um de seus trabalhos pioneiros, Annie Leonard esteve em países asiáticos para identificar os trajetos do lixo exportado dos Estados Unidos e Europa. Suas constatações sobre o tráfico internacional de lixo foram documentadas não apenas em grande número de artigos, mas também em depoimentos perante o Congresso americano, buscando banir tais exportações destinadas ao Terceiro Mundo.
Coordenadora do “Funders Workgroup for Sustainable Production and Consumption” (Grupo de Trabalho dos Financiadores para a Produção e Consumo Sustentáveis), faz atualmente palestras sobre os impactos do materialismo e do consumismo sobre a economia global e a saúde internacional. Em “A História das Coisas” a escritora (que também é a narradora) examina os custos sociais, ambientais e globais da extração, produção, distribuição, consumo e descarte. Analisando uma cultura movida a coisas, ela identifica nas políticas pós-Segunda Guerra Mundial a semente das noções de consumismo e examina como essas noções ainda orientam grande parte das economias do mundo.
Tanto na limitada vida útil de um computador quanto nas mudanças em qualquer ramo da moda, ela vê exemplos de produtos projetados para durarem pouco (fabricados para ficarem obsoletos rapidamente) ou para criarem no consumidor o desejo de atualizá-los regularmente (o seguidor da moda é bombardeado com a ideia de que precisa “continuar na moda”, ou seja, comprar os novos lançamentos). E assim, Annie Leonard afirma que essas ações de “obsolescência programada” e de “obsolescência percebida” movimentam a máquina do consumismo. Com um enfoque provocativo mas realista, o filme pode gerar reações dos mais diferentes tipos. Acho que essa é a ideia: fazer pensar! Queremos continuar vivendo nesse sistema de consumo?
O curta pode ser visto em inglês em sua versão original — http://www.storyofstuff.org/ —, ou legendado em português, através do vídeo aqui disponibilizado.
Se o tema lhe interessa, assista e tire suas próprias conclusões. Talvez as imagens (e a contundente explicação da narradora) revelem muito mais de nosso cotidiano do que realmente gostaríamos de ver. Eu sou suspeita: sou fã do trabalho de Annie Leonard! E há anos venho insistindo em divulgá-lo. Acho que o curta-metragem escancara o tamanho do embuste político que existe no capitalismo.