quarta-feira, 9 de maio de 2012

Sobre cães e gente


Exatamente um ano atrás eu brincava, toda feliz, com meu cachorrinho, quando ouvi, em alto e bom som, uma exclamação ácida, seguida de uma questão:

― Mas o que é isso! Por que você não adotou uma criança? ― disse-me uma prima, visivelmente incomodada com meu afeto.

― Não adotei uma criança porque eu queria um cachorro! ― respondi, um tanto surpresa, sem entender bem qual seria a razão da pergunta. E emendei, em tom de esclarecimento:

― Uma coisa não tem nada a ver com a outra. Gente é gente. Bicho é bicho. E eu estava louca por um cachorrinho.

Não muito satisfeita, a prima mudou de assunto, conversando com sua madrinha, que estava sentada ao lado. E fiquei pensando... “Que conflito era aquele?”. O ar severo de minha prima me passou “uma mensagem de encíclica papal” (como diria Mafalda – de Quino – ao presenciar uma cena de injustiça social nos anos 70). Ao dedicar meu afeto a um cachorrinho, estaria eu sendo política e socialmente incorreta? Confesso que fiquei desconfortável, não por minha decisão de ter um cachorro e tratá-lo bem, carinhosamente, embora como cachorro! Meu desconforto se manifestava quando eu revia a cena inicial que originou a pergunta sobre a adoção. Não tenho absolutamente nada contra adoções de crianças, muito pelo contrário. Aplaudo a iniciativa. Só não entendo a comparação entre cachorrinho e criança. São coisas completamente diferentes.

O tema é polêmico, eu sei. E é bem possível que muitas pessoas façam confusões. Afinal, quem é dono de todas as suas emoções? É aí que vale a pena lembrar um comentário de Cesar Ades (1943–2012), que foi professor do Instituto de Psicologia da USP e um dos pioneiros no estudo de comportamento animal no Brasil, ao falar sobre a relação entre gente e bichos, em uma recente entrevista:

“São coisas diferentes. O cachorro nos dá coisas que o ser humano não dá, mas nenhum bicho dá tudo que os humanos dão. Ele nos dá uma alegria canina. Só isso já é culturalmente válido.”

É isso! Gente é gente. Cachorro é cachorro. Ou, como tão bem disse um dia o filósofo do futebol, Rivelino: “Uma coisa é uma coisa. Outra coisa é outra coisa.” Se você quer uma criança e não pode tê-la biologicamente, não tenha dúvida: adote! Adote e seja muito feliz!

 

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