Passei a infância sem nenhum bicho de
estimação, em uma chácara repleta de animais no quintal e dentro de casa. A
poucos metros da janela de meu quarto, um pomar dava guarida a dezenas de
espécies de pássaros que me acordavam antes do nascer do sol. Mas, se houvesse
competição matinal de barulho, o alvoroço do galinheiro seria campeão. Um pouco
além do pomar, as vacas holandesas tomavam conta do pasto e a cachorrada corria
com alguns bezerros.
Circulando pela casa, a fauna também era expressiva.
Um papagaio surtado gritava “Louro! Dá o pé, Louro!” – o dia inteiro. Uma arara
aparecia voando na hora do almoço, comia mamão na janela da cozinha e ia embora,
para voltar no outro dia. Uma gata de nome estranho – Ansialízia – rasgava as almofadas da sala como passatempo predileto
e, à noite, dormia na cama sobre os pés de meu pai. Um galo enorme, criado como
pinto guaxo, vivia mais na varanda que no galinheiro, e um cachorro, sempre assustado,
corria quando minha mãe aparecia. Pois ela, que (inacreditavelmente) odiava animais
soltos pela casa, nunca permitiu que eu tivesse um. Por alguma razão que
desconheço, essa decisão materna soou tão forte que, mesmo entre tantos bichos,
não conseguia chamar nenhum de “meu”.
Cresci. Nunca mais pensei em ter um bicho, até
que fui fulminada por um caso de amor à primeira vista. Recíproco. Quando
passei em frente a um pet shop,
nos olhamos ao mesmo tempo e ele se lançou adiante, raspando as patas
desesperadamente contra o vidro, chamando-me. Ele tinha 42 dias e era como um
ursinho de pelúcia com olhos luminosos. E eu prontamente atendi a seu chamado.
Foi um relâmpago. Uma escolha mútua.
Desde então recebo beijos caninos diariamente.
Dezenas de dóceis e meigas lambidinhas em meu queixo. E fico derretida como criança
apaixonada pelo mais belo brinquedo novo.
Blógui Dógui Amaral Au-Au: esse é o nome de
meu poodle toy. Bem... Toy,
no caso dele, foi só no papel. Blógui cresceu mais que o esperado e hoje, com três
anos, é um senhor cachorro que me adestrou adequadamente. Sou obediente e
entendo suas necessidades. Brincamos com sua bola predileta, corremos pelo
gramado e tomamos nossas refeições juntinhos. Ele tem os seus defeitos. É possessivo
e late grosso, como o macho-alfa do pedaço que conhece seu território e sabe
defender o que é seu. Meu coração faz parte de suas posses (e tenho certeza de que
ele sabe disso muito bem).
Como é que pude viver saudavelmente esse tempo
todo sem um cachorrinho perto de mim?