terça-feira, 25 de setembro de 2012

Caricatura, cartum, charge... “Qual é a graça? Um manifesto”, por Alberto Dines


Sou fã de carteirinha do texto leve e inteligente de Alberto Dines. Hoje, no Observatório da Imprensa, ele faz um manifesto sobre a crítica visceral do bom humor — “O riso é libertário. Impossível suprimi-lo, sufocá-lo.” — e as charges anti-islâmicas do semanário satírico francês Charlie Hebdo. Um artigo irretocável. Aproveite:


DO VANDALISMO AO VAUDEVILLE
Qual é a graça? Um manifesto

Por Alberto Dines em 25/setembro/2012, na edição 713 do OIObservatório da Imprensa

O homem é o único animal que ri e este particularismo faz do humor um tema da maior seriedade. Socrátes, São Tomás de Aquino, Immanuel Kant debruçaram-se sobre as diferentes formas de humor, mas Sigmund Freud parece ter encontrado a melhor interpretação – ou, pelo menos, a mais política – ao constatar que o riso é resultado da remoção de uma censura interna. Alívio.

O riso é libertário. Impossível suprimi-lo, sufocá-lo. Graças ao riso o rei infalível aparece nu, inexpugnáveis muralhas mostram-se feitas de barro e vilões mal-encarados ficam ridículos sentados na privada. Comédias derrubaram déspotas ainda no império romano, sátiras desarmaram a ignorância da Inquisição portuguesa, os pequenos pasquins do Renascimento sugeriram piadas que de outra forma não poderiam ser engendradas.

Contra a ignorância

Caricatura vem do italiano caricare, carregar, exagerar, buscar o grotesco; charge vem do francês, charger, forçar; cartum vem do inglês, cartoon, cartão, onde se fazem desenhos humorísticos. O Ocidente fez do riso uma arma a um tempo destruidora e enriquecedora, agressiva e benfazeja, ponte e ruptura.

De qualquer forma, a caricatura é essencialmente jornalística, como escreveu Henry James, porque é “a crítica do momento no exato momento”. O que nos leva a concluir que as charges anti-islâmicas do semanário satírico francês Charlie Hebdo não são engraçadas porque se mostraram flagrantemente oportunistas, extemporâneas, obrigatórias.

Se o paroxismo produzido pelo clipe anti-Maomé escancarou a distância do mundo islâmico da noção elementar de liberdade de expressão, o sensacionalismo do Charlie Hebdo mostra como a “imprensa livre” tripudia sobre as regras de convivência democrática. Se o mau humor não consegue produzir bom humor, algo desandou – no traço, na letra ou no espírito do gozador.

Inexiste um conflito entre as civilizações quando o Oriente deixa-se levar pelo delírio e o Ocidente pelo vaudeville.

Caricaturistas, uni-vos contra a simploriedade. Abaixo a repetição, vamos gozar os chargistas sem inspiração.

FONTE DO TEXTO:

FONTE DA IMAGEM: Edição 713 – 




 

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