sábado, 27 de outubro de 2012

André Matos Moreira... Quem é esse cara?



Na Fazenda Azulão — a primeira morada da família Mattos lá pelos idos de 1902 — uma bela mata protegia a casa do calorão, deixando passar uma aragem úmida e refrescante nas tardes de sol a pino. A casa, erguida pelo patriarca Francisco de Mattos Pereira, já não existe mais. A Azulão foi retalhada por heranças, mas boa parte dessa mata foi mantida, soberana. E ainda hoje ameniza o calor para quem passa por lá.

Erguida pela família de uma das netas do patriarca — Clarinda de Matos Moreira e seu marido Devaldo Moreira, paulista e poeta —, outra casa foi construída no local em que hoje um pedaço da Azulão leva o nome de Fazenda Coqueiro. E nela morou um menino... Um menino que não andou a cavalo, não correu com medo de boi brabo e tampouco brincou de arar a terra. Um menino quieto, que desfrutou da sombra da mata para caminhar, sentar-se e ler — André Matos Moreira.

Esse trineto de Francisco de Mattos Pereira, e bisneto do Zé Leitão, deu dor de cabeça à família. Baita menino esquisito! Todo mundo esperava que ele, se não morresse logo, fosse diferente mesmo. Afinal, tinha nascido muitas horas após o rompimento da bolsa — assim diziam as comadres — e até o Dr. Vilela, logo após o parto, no dia 10 de outubro de 1984, pressentia algum tipo de problema: “Vamos ver o que vai acontecer...”.

Mas o menino, filho de José Humberto de Matos Moreira e Neusa Carmo Gonçalves, sobreviveu e acabou crescendo na Fazenda Coqueiro, criado pelos avós paternos.

As esquisitices começaram mesmo quando André desandou a ler antes de completar cinco anos e não parou mais. Encantado com a descoberta das formas das letras, seus desenhos e significados, passou a devorar livros e revistas com mais apetite do que para mingau de aveia. E não havia cristão que o distraísse enquanto estava lendo — nem uma promessa de bicicleta nova ou de caminhãozinho basculante. Tampouco um pedação de rapadura com queijo fresco dava conta do recado. Até que um dia, na cidade, André descobriu outra paixão que deixou os livros em segundo plano.

Era uma sala, na casa de Eliane Freitas de Alencar, em um final de tarde. André, impecável em sua roupa de passeio, se distraía com uma revista quase de seu tamanho enquanto sua avó Clarinda, que o levara consigo, conversava com algumas amigas. De repente, um som nunca antes ouvido o deixou paralisado. E ele me contou, com detalhes: “Eu tinha quatro anos de idade e uma centelha me atingiu. Somente hoje eu sei explicar o que senti. Foi como se uma corrente elétrica tivesse me atravessado. Eu nunca tinha escutado nada parecido. E tampouco entendia de onde saía aquele som. Havia um piano na sala, todos estavam em silêncio e a Eliane o tocava. Mas eu nem fazia ideia de que a música vinha do piano. Aquele som foi inesquecível... E uma certeza naquele momento tomou conta de mim: ‘É isso que quero fazer!’, decidi”.

E o menino levou a sério sua decisão. Alguns meses depois, no aniversário de cinco anos, bateu pé e não deixou a moça da loja embrulhar aquele imenso carro de bombeiros que a avó escolhera para lhe dar. Pediu um piano! E a avó o atendeu, com o único então disponível: um pianinho de brinquedo.

André tanto tocou e tanto pediu, que a avó Clarinda cedeu: levou-o para ter umas aulas de piano com a professora Iza. E ele logo começou a ler partituras, sem nem saber como. Impressionada com a aptidão do neto, Dona Clarinda o encaminhou para estudar piano clássico com a professora Eliane, a mesma que lhe apresentara o som que o eletrizara alguns meses antes.

A partir daí a história é de uma dedicação espartana. André passou a adolescência estudando prazerosamente, fazendo exatamente o que descobriu que queria fazer, com o incentivo da avó. Assim, concluiu o curso de nível técnico em piano, em Campo Grande, e ganhou o tão desejado presente, agora de gente grande: um piano... digital. Ainda residindo em sua terra natal, Dourados, MS, outros interesses afloraram e ele apaixonou-se, quase casou. Foi sua primeira desilusão amorosa. A tristeza o levou a outras plagas. Foi para Goiás (mas felizmente não formou uma dupla caipira...). Ali trabalhou em um conservatório e começou a firmar-se como pianista, junto com um preparador vocal. Quando deu por si, já estava produzindo arranjos, compondo e dirigindo gravações. Estudou durante quatro anos no Conservatório de Goiás, enquanto ministrava aulas de piano em Goianésia e Goiânia e dirigia um coro vocal em Ceres.

Voltou a Dourados e tornou-se pianista auxiliar na Igreja Presbiteriana do Brasil – a “igreja do relógio”. Em 2008 dedicou-se a um curso de afinação e restauração de piano, em Campo Grande, com Albino Ferraz. Em seguida sua avó teve diagnóstico de câncer e André decidiu permanecer em Dourados. Hoje ele tem a alegria de acompanhá-la, curada, enquanto ensina piano, estuda e compõe, além de ser pianista e regente do coral da igreja do relógio. E, graças a Deus, continua sendo um “cara esquisito”, daqueles que ficam horas e horas ao piano, ou imerso em leituras.

Pois é... Dizem que avós estragam os netos. Neste caso, Dona Clarinda, todos na cidade estão lhe agradecendo. Que belíssimo “estrago” a senhora fez!

E hoje, sábado, dia 27 de outubro de 2012, você tem a oportunidade de conhecer André Matos Moreira pessoalmente. Ele tocará em um concerto beneficente no Teatro Municipal de Dourados, às 19h. A renda será revertida para o GAAD-Acolher – Grupo de Apoio à Adoção de Dourados. Os ingressos estão à venda na Update – 3422-0300 – e na Livraria Canto das Letras – 3427-0203.

Que sorte a nossa! Eu não vou perder esse concerto.

 

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