Pesquisadores da Universidade Humboldt e da Universidade Técnica
de Darmastadt, na Alemanha, fizeram um estudo com 600 pessoas e chegaram à
conclusão de que o Facebook provoca sérios ressentimentos em cerca de um terço
dos usuários. O que causaria toda essa amargura seriam sobretudo fotos de
férias e a comparação com o nível de socialização dos amigos, ou seja, a
contabilização de “likes” e de parabéns pelo aniversário, por exemplo; mas
foram observadas muitas reações negativas em usuários na faixa dos 30 anos em
relação à vida familiar dos outros.
Inveja, teu nome é Facebook.
Será mesmo? Segundo matéria publicada aqui no jornal, e
amplamente divulgada na rede social, “os pesquisadores disseram que os entrevistados
eram alemães, mas esperavam que os resultados fossem os mesmos
internacionalmente, já que a inveja é um sentimento universal”.
É aqui que eu me permito discordar dos doutores. A inveja é
universal, com certeza, mas obedece às manhas e manias da cultura local. Não
acredito que aqui no Brasil, onde temos feriados e conseguimos nos distrair
mesmo durante a semana, férias causem tanta inveja. Por outro lado, ninguém na
Alemanha deve ter inveja (ou seria raiva?) da aposentadoria de certos
funcionários públicos privilegiados, ou das mordomias dos parlamentares.
Também não acredito que a vida familiar dos outros possa
estressar de tal forma os usuários latinos, em geral, e os brasileiros, em
particular, que frequentemente têm até mais vida familiar do que gostariam de
ter, mesmo quando moram sozinhos.
Os alemães, diz ainda a pesquisa, têm inveja das fotos dos
carros postadas pelos amigos. Ora, onde se enquadram nisso os nova-iorquinos ou
parisienses, por exemplo, que em sua vasta maioria usam transportes públicos?
Qualidades negativas
Segundo o estudo, as piores reações partem de usuários que
entram na rede passivamente, sem interagir com ninguém: “O acompanhamento
passivo provoca emoções amargas, com os usuários invejando principalmente a
felicidade dos outros, o modo como passam as férias e como socializam”.
Não sei quais são as percentagens de usuários passivos de
Facebook na Alemanha e no resto do mundo, mas arrisco o palpite de que, no
Brasil, os índices devem ser diferentes. Nós adoramos redes sociais. Fomos os
maiores usuários do Orkut e já estamos em segundo lugar no Facebook. Segundo o
site socialbakers.com, 82,32% dos brasileiros que têm acesso à internet
participam do Facebook, contra apenas 37,56% dos alemães: será, então, que o
resultado de uma pesquisa feita na Alemanha pode mesmo se aplicar à nossa
sociedade?
Sei que a inveja é uma constante. Seres humanos são seres
humanos em qualquer ponto do planeta. Ainda assim, volto a insistir no peso dos
fatores culturais. O que causa inveja num país, ou mesmo num bairro, não é o
que causa inveja em outro.
Além disso, cada cultura tem a sua própria maneira de se
comportar na internet. Acho precipitado concluir que a humanidade inteira sofra
do mesmo mal ao se conectar ao Facebook.
Pessoalmente, não gosto do Facebook, nem como empresa, nem como
interface. Mas ando meio cansada de ver “estudos” e “pesquisas” que só atribuem
qualidades negativas à internet. O mundo não é perfeito, o ser humano é a
imperfeição em pessoa; já trazíamos todos os nossos defeitos conosco muito
antes de a rede ser inventada.
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Cora Rónai é colunista de O Globo.
[O artigo foi clipado do Observatório da Imprensa]