sexta-feira, 22 de maio de 2015

Com ou sem legendas?



Para quem gosta de cinema, bons filmes permitem o envolvimento dos sentidos e transportam o espectador a dimensões inexploradas no mundo real. Com a cumplicidade da penumbra, o riso fica fácil, o choro extravasa sem medo, o olho entreaberto espia pelos vãos dos dedos e a gargalhada pode encher o ar. Pavor e nojo, desejo e prazer são revelados sem pudores.

Mas, apesar da atual disponibilidade de filmes, do medíocre ao insigne, para todos os tipos de público, o espectador que prefere som original está perdendo espaço. Os cinemas estão lotados de filmes dublados.

Tento imaginar qual é a vantagem em assistir um filme sem ter acesso à totalidade da interpretação dos atores e atrizes. Dedicam horas, dias, talvez meses em busca da nuance de voz planejada. Ensaios e mais ensaios para adequar o timbre, o sotaque, a entonação desejada para o personagem... E tudo isso é jogado fora com a dublagem.

Por outro lado, concordo que existem bons dubladores. Mas serão eles capazes de produzir a mesma expressividade da voz original? Li dezenas de opiniões sobre os “prazeres” de assistir uma película dublada, tais como: “Se leio as legendas acabo perdendo imagens do filme”, “Prefiro dublado para ver as cenas de ação”, “Você não se perde e nem se distrai com a legenda”. Honestamente, nenhum dos comentários me convenceu, a não ser para filmes (bem) infantis. Em resumo: filme dublado é bom para criança pequena, que ainda não sabe ler. Estendo o mesmo argumento para adultos: filme dublado é bom para quem não lê, seja por não saber de vez ou por não conseguir fazê-lo com agilidade suficiente para acompanhar a velocidade das legendas uma lamentável falta de prática. Lê melhor, com mais rapidez e capacidade de compreensão, quem lê sempre. E essa triste limitação acaba ditando a medida do mercado, com cinemas oferecendo filmes dublados para um público cada vez maior de leitores enferrujados.

Além disso, sem estímulo à leitura, cada vez menos espectadores terão a experiência, no caso de filmes baseados em obras literárias, de sair do cinema comentando se o livro é, ou não, melhor. Esse deleite está ao alcance apenas de quem não evita o universo que a leitura proporciona.

Gostaria de dispor de mais filmes legendados, não por simples questão de gosto, mas pelo prazer em ouvir a insubstituível interpretação vocal que vem com o som original. E torço (muito!) para que mais e mais brasileiros tenham condições de viver outra realidade: ler prazerosamente, inclusive no cinema.



 

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